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Igualdade dentro e fora das quatro linhas

STJD promove debate sobre igualdade e combate ao racismo no futebol

19 de novembro às 09:00

O futebol, esporte mais popular do Brasil, reflete em campo as tensões raciais presentes na sociedade brasileira. Apesar de historicamente ter sido o ambiente em que atletas negros mais se destacaram, o futebol ainda é um dos espaços onde o racismo se manifesta de forma explícita. Na busca pela erradicação desse crime, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Futebol (STJD) mantém atuação firme para punir infratores com base na legislação desportiva e para promover educação entre torcedores, profissionais e amantes do esporte.

Em referência ao Dia da Consciência Negra, o STJD do Futebol promoveu, nesta terça-feira, 18 de novembro, o evento “IGUALDADE: DENTRO E FORA DAS 4 LINHAS”. Além de reunir integrantes do Tribunal e especialistas em Direito Desportivo, o encontro recebeu profissionais com lugar de fala, que compartilharam vivências e apresentaram sugestões de medidas urgentes para o combate ao racismo no futebol.

Responsável por conduzir os painéis, a auditora Juliana Camões, integrante da Quarta Comissão Disciplinar, mediou discussões sobre normas, punições, humanidade, ética e o papel da Justiça Desportiva na transformação cultural do esporte brasileiro.

“O STJD tem sido, historicamente, um órgão comprometido não apenas com a aplicação da lei desportiva, mas com a promoção da integridade e da diversidade do respeito. Quando julgamos casos de racismo, a gente não trata de incidente isolado. A gente trata de feridas abertas, que atravessam séculos e exigem uma resposta institucional firme, pedagógica e, sobretudo, transformadora. Por isso que, neste momento, a gente busca aproximar a Justiça Desportiva de outros atores: como atletas, clubes, federações, imprensa, psicólogos, educadores, porque nós sabemos, não há dúvidas nisso, que o racismo não se enfrenta apenas com sanção.

Quero parabenizar a iniciativa desse tribunal na pessoa do nosso presidente Luís Veríssimo. que abraçou, sobretudo, de prontidão a ideia de a gente trazer esse debate aqui num cenário tão importante”, afirmou Juliana Camões. A primeira mesa debateu as Práticas e desafios do futebol e da Justiça Desportiva no combate ao racismo no esporte reuniu Ronald Siqueira, Subprocurador-geral do STJD; Eduardo Vargas, Advogado da ABRAFUT e consultor jurídico do Observatório da Discriminação Racial do Futebol; Adrien Hassen, Presidente da Terceira Comissão Disciplinar do STJD e Coautora do Protocolo de Julgamento com Perspectiva Racial; Luiz Gabriel, Auditor da Segunda Comissão Disciplinar do STJD, Raquel Lima, Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo (IBDD) e Sálvio Dino, Presidente da Quarta Comissão Disciplinar do STJD, que sugeriu a criação de um projeto para 2026 com ações visando a promoção de valores antirracistas e socioeducativas:

  • Difundir o direito desportivo e o sistema de Justiça Desportiva por todo o país, iniciando pelas faculdades, pelos cursos jurídicos, pelos cursos de educação física e tantos outros de nível superior, para levar à promoção dos valores antirracistas e da igualdade substantiva, real, efetiva, a partir da força aglutinante e mobilizadora que o esporte tem, e dentre eles o futebol com maior ênfase e destaque.

  • Readequação do Código Brasileiro de Justiça Desportiva. É preciso estimular e fiscalizar a adoção de projetos pedagógicos que sejam robustos. Ações de prevenção socioeducativa por parte dos clubes, com um mecanismo relevante, inclusive na fixação da dosimetria das penas, no nosso trabalho judicante.

  • Destinação das multas aplicadas no artigo 243-G para financiamento de ações antirracistas no sistema desportivo.

VOZES QUE INSPIRAM TRANSFORMAÇÃO:

O segundo painel foi composto pelo ex-atleta Aranha, pela técnica da Seleção Brasileira de Fut7, Dilma Mendes e pelo Diretor Executivo do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, Marcelo Carvalho.

Aranha desabafou sobre o problema e afirmou que é importante discutir para combater o racismo.

“Não pode ser uma surpresa o racismo no futebol, porque ele faz parte, ele está no DNA do futebol, o que a gente pode fazer é combater, discutir. Não ter como resolver um problema sem falar sobre ele, e é estar participando de eventos como esse que vai fortalecer esse combate contra o racismo, para a gente minimizar o seu prejuízo, as causas. Mas eliminar é muito difícil, até porque acredito que levará ainda anos e anos para que a gente possa ter um ambiente mais saudável dentro dos estádios”, disse Aranha.

Técnica tetracampeã da América, Dilma Mendes emocionou a todos com sua história de vida e luta no combate ao racismo.

“A justiça que não existiu para a minha geração precisa existir agora e ela só existe quando a gente transforma leis em práticas. Quando a gente transforma discursos em ações. Quando a gente transforma dor em propósito. Quando a gente entende que estar vivo não basta — é preciso estar vivo com dignidade.

Eu aceitei estar aqui porque eu acredito que a Justiça Desportiva pode ser um instrumento real de transformação social. Porque o Futebol sempre foi um reflexo do Brasil. E tudo aquilo que acontece lá dentro das quatro linhas… acontece aqui fora também. Eu aprendi cedo que não basta punir. É preciso prevenir, educar, acolher e reparar.

Reparar — essa palavra que tantos têm medo de pronunciar, porque reconhecer o que foi feito contra nós dói. Mas dói mais ainda continuar fingindo que nada aconteceu.

O racismo é crime. Mas mais do que crime, ele é uma ferida aberta no nosso país. E essa ferida ainda sangra no Futebol, nas arquibancadas, nas decisões, no silêncio das instituições, no olhar atravessado que tenta nos diminuir, no comentário “brincadeira” que não tem graça nenhuma.

Mas eu estou aqui porque eu sei que o futebol também pode curar. Pode juntar. Pode educar. Pode transformar”.

Encerrando os debates, Marcelo Carvalho apresentou dados do Observatório da Discriminação Racial no Futebol e fez um alerta.

Ou a gente usa, de fato, o futebol como uma janela, como um instrumento de luta antirracista, ou a gente vai ver o futebol ser transformado em instrumento de propagação de ódio e de violência.

Cada um precisa fazer a sua parte, e é por isso que eu estou usando esse espaço para dizer de novo, precisamos cada um dentro do seu espaço, cada um dentro do seu local, fazer a sua parte. O observatório continua produzindo dados.

É relevante para fechar minha fala, é que pela primeira vez, em 2024, nós vamos ter uma diminuição das denúncias. Se em 2023 foram 136 denúncias no futebol, em 2024 foram 109. Mas não deu nem tempo de comemorar, porque nós estamos em novembro de 2025 e eu acabo de ser informado pela equipe do Observatório que já superamos a marca de 116 denúncias em 2025, ou seja... não tivemos nem tempo de comemorar a diminuição das denúncias de racismo no futebol.

Elas continuam e continuam com uma violência que às vezes nos choca. Mas, às vezes, não. Porque, infelizmente, eu, Aranha, Dilma e tantas outras pessoas pretas, infelizmente, estamos acostumados com essa violência que acontece no nosso dia a dia. Mas precisamos não mais aceitar isso de maneira passiva. Precisamos lutar, lutar e lutar. E precisamos do apoio dos não negros e precisamos principalmente do apoio de quem comanda e gerencia o futebol brasileiro. Chega de silenciamento, chega de violência! O futebol precisa ser esse instrumento de inclusão e de luta contra o racismo e todas as formas de preconceito e violência”, encerrou.

Confira fotos do evento: https://www.stjd.org.br/comunicacao/galerias/igualdade-dentro-e-fora-das-4-linhas


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